01/09/19
A importância dos testes clínicos regulados para as terapias de rejuvenescimento
Um remédio não é algo que uma pessoa responsável pode simplesmente "experimentar". Sabe-se que os remédios em geral têm efeitos colaterais, mesmo quando são consideravelmente seguros e eficazes. Se existir uma dúvida considerável sobre o quão seguro é um remédio, só é razoável tomá-lo como último recurso, em uma situação extrema. E a forma mais socialmente aceita de verificar a segurança de um remédio é através de testes clínicos supervisionados pelo Estado. Isso pode parecer óbvio, mas é importante enfatizar esse fato no contexto da comunidade da área de rejuvenescimento, porque o entusiasmo com testes em modelos animais ou com as fases iniciais de testes clínicos em humanos, apesar de ser completamente justificável nessa comunidade, está longe de ser compartilhado pelo público geral. É verdade que testes em modelos animais e testes preliminares em humanos são uma parte importante do processo completo de aprovação oficial, e permitem a existência das fases seguintes do processo. Porém, se o processo de aprovação não for completado até o final, as pessoas, de uma forma geral, não vão usar as terapias de rejuvenescimento, e não podemos esquecer que o objetivo principal é que nós, nossos parentes, amigos, colegas, vizinhos, clientes, empregados, patrões — ou seja, as pessoas em geral — possamos rejuvenescer e ficar livres da inevitabilidade da deterioração e morte causadas pelo envelhecimento.
Assim, no atual estado do desenvolvimento das terapias de rejuvenescimento, com alguns medicamentos senolíticos entrando em fases avançadas dos testes clínicos com humanos, é muito importante que a comunidade da área de rejuvenescimento esteja especialmente atenta ao progresso dos testes clínicos e informe o resto da sociedade quanto aos eventuais resultados positivos, porque esses resultados é que vão convencer o público geral a apoiar o desenvolvimento das terapias de rejuvenescimento. Quando uma agência regulatória estatal de peso aprovar um medicamento senolítico — só então — o público geral mundial vai considerá-lo seguro para ser usado. Só então os médicos o receitarão a seus pacientes. Só então as empresas farmacêuticas investirão tudo o que podem em publicidade para os senolíticos. Só então as farmácias vão vender senolíticos. E só então as pessoas vão começar a rejuvenescer.
Há algumas iniciativas na comunidade da área de rejuvenescimento quanto à autoexperimentação de diferentes tipos de senolíticos que já estão atualmente disponíveis. Entretanto, o grau de precisão científica necessário para se verificar a segurança e eficácia desses medicamentos somente pode ser alcançado através de um processo muito organizado, e a autoexperimentação geralmente é um processo não coordenado e atomizado. Da perspectiva de uma pessoa que não está familiarizada com as terapias de rejuvenescimento, a autoexperimentação não é algo confiável como uma garantia de segurança ou eficácia. Portanto, apesar da autoexperimentação parecer às vezes ser algo mais fácil e barato que os testes clínicos oficiais, ela não se mostra uma opção viável para a popularização das terapias de rejuvenescimento, que poderia começar com os senolíticos.
Dessa forma, se os testes clínicos supervisionados pelo Estado são vitais para o desenvolvimento das terapias de rejuvenescimento, a forma como o Estado é constituído e trata o assunto deve também receber a atenção da comunidade da área de rejuvenescimento. Porém, todos sabemos que discutir política, por alguma razão antropológica, geralmente faz as pessoas entrarem em um estado no qual muito facilmente se tornam hostis a pessoas que pensam diferentemente. Neste sentido, é muito interessante a estratégia do Partido da Pesquisa em Saúde, da Alemanha, que foca somente na medicina de rejuvenescimento. Seu caso deveria ser cuidadosamente estudado pela comunidade global da área de rejuvenescimento.
Portanto, divulgar os resultados dos testes clínicos regulamentados, e agir quanto a como o Estado lida com a questão dos testes clínicos, são duas importantes atividades para a comunidade da área de rejuvenescimento em relação aos testes clínicos regulamentados. O que mais nossa comunidade pode fazer para facilitar que os testes clínicos com senolíticos (e outras tecnologias de rejuvenescimento) sejam realizados apropriadamente?
Lá no fundo, sabemos a resposta. Como praticamente todo mundo na área de rejuvenescimento sabe, testes clínicos com humanos são muito caros. Assim, um problema imenso costuma ser a falta de recursos financeiros para realizá-los. Obviamente, ativistas muito ricos podem ajudar investindo em empresas que possam realizar esses testes clínicos, e tentando convencer outras pessoas ricas a fazerem o mesmo. Esta estratégia já vem sendo implementada na comunidade de rejuvenescimento, mas o número de pessoas ricas é muito menor do que o número total de pessoas. Felizmente, pessoas que não sejam ricas também têm uma forma de ajudar essas empresas a conseguir os recursos financeiros necessários, que é aumentar as expectativas de lucro de investidores em potencial através das duas estratégias mencionadas anteriormente — divulgar os resultados das fases iniciais dos testes clínicos, e agir para evitar problemas na regulação estatal dos testes clínicos. Se os investidores em potencial acreditarem que os medicamentos vão funcionar, e que esses medicamentos terão autorização para serem vendidos, eles provavelmente vão investir em empresas que podem realizar esses testes clínicos, porque eles já sabem que o mercado para terapias de rejuvenescimento eficazes seria imenso.
Levando-se em conta esse cenário, seria conveniente a comunidade da área de rejuvenescimento focar sua atenção nos testes clínicos dos senolíticos. Nos próximos anos, os primeiros senolíticos provavelmente chegarão ao mercado, e esse é um momento para o qual devemos estar preparados. Será o momento em que o público geral realmente prestará atenção aos senolíticos, às terapias de rejuvenescimento, e à comunidade da área de rejuvenescimento, porque os medicamentos de rejuvenescimento chegarão ao público geral da mesma forma que todos os outros medicamentos chegaram ao longo dos anos: a pessoa vai ao médico, o médico receita o medicamento, a pessoa o compra na farmácia e o toma. A diferença é que, no caso dos medicamentos de rejuvenescimento, se eles realmente forem eficazes, as pessoas vão perceber que o futuro chegou.
Nicolas Chernavsky é jornalista formado na USP e tradutor e editor de livros de biotecnologia.